quinta-feira, dezembro 11, 2008

Ponte dos milagres (XI)

Contei-lhe num dia frio de Novembro, com as mãos dela dentro das minhas, e dentro do peito um desejo enorme de morrer. Há dias que não desejamos acordar no dia seguinte, pensamos que podemos dormir durante o sono sem dar por nada, e que Deus virá erguer o nosso corpo já leve para nos levar com ele.

Fui eu meu amor, fui eu que raptei a menina do hospital. Sou eu meu amor quem tem que ocupar esse lugar onde estás, temos que trocar de posições. Tu, meu amor, é que tens que me trazer a broa e o queijo.

Os seus olhos de mel derramaram-se e o chão ficou cheio das suas lágrimas doces. Demorou uma eternidade para dizer uma palavra e quando a disse tive vontade maior ainda de morrer. Tudo nela era perdão e carinho e por isso a minha vergonha tornou-se ainda maior. Disse uma e duas vezes que tudo deveria ficar assim, que não devia dizer a minha verdade a mais ninguém. Colou nos meus lábios um manto de silêncio e pediu que fosse para sempre.

Que fazemos quando somos os culpados e os inocentes não querem trocar de lugar connosco? Como podemos matar esta culpa que nos nasce a cada manhã maior? Que amor redentor é este que nos acolhe em toda a nossa imperfeição?

A minha mulher encheu o chão com lágrimas de mel e eu bebi-as uma a uma e mesmo assim sinto-me azedo como um leite coalhado. Um milagre, precisava tanto de um milagre.
~CC~

2 comentários:

isabel mendes ferreira disse...

sem ter os passos para atravessar esta PONTE!!!!!




curvo.me.

Gregório Salvaterra disse...

Que bela esta ponte de amor.
Que bela esta fonte de palavras.
Beijo
*jj*