segunda-feira, setembro 24, 2012

Mais um


Os lugares que se escondem desta fúria negra dos tempos são os únicos onde ainda me sinto qualquer coisa viva, onde há momentos em que estou em paz e penso que há um futuro, um para nós (país), um para mim. No sábado o mar alentejano tinha a temperatura necessária ao banho de mudar mais um ano no calendário e apenas meia dúzia de pessoas estendidas na areia. Bendito Outono que esvazias as praias de quem menos as ama. Houve um canto baixinho dos poucos que aceitaram fazer-se à estrada, um canto doce que chegou para aquecer-me. No dia seguinte choveu muito, acordámos sem sol mas ainda quentes do dia anterior. A chuva costuma chegar um dia antes e entristecer-me, desta vez soube esperar. Gosto da média feita de muitos dias de sol cortados por um de boa chuva, daquela que molha e nos lava.

~CC~

terça-feira, setembro 18, 2012

Sinais dos tempos


Não sei se foi exactamente a história ou se o modo como ele contou a história. Mais belo que o amor...só mesmo as palavras que sobre ele se escrevem. A verdade é que senti os olhos a ficarem mais e mais húmidos à medida que ouvia os sinais de hoje (Fernando Alves na TSF). São os sinais dos tempos, vivemos em equilíbrio tortuoso na corda esticada.

~CC~

domingo, setembro 16, 2012

Historiazinhas (I)


Dona Matilde não quis viver mais desde o mês em que a figura já magra e curvada dele não apareceu à sexta feira, hora marcada pelas 9h30m, ainda os correios não se tinham animado com gente a vir buscar encomendas e pensões, já que cartas eram raras. Eram poucos os seus motivos de vida, uma solidão inteira espraiada no balcão, a tentar habituar-se com dificuldade a todos os botões electrónicos que tinham passado a substituir os bons dias. As senhas mudavam de cor com os dias da semana, já a sua dificuldade em avistar com clareza o visor, essa não mudava.

Tinha atendido o senhor Jacinto durante aqueles 20 anos em que ali estivera e ele também. Tinha sido logo no primeiro ano de atendimento que intrigada com o misterioso senhor das sextas feiras tinha guardado delicadamente a carta por baixo do balcão e depois no bolso da bata. O coração saltava-lhe do peito mal se sentou no sofá da sua sala e a abriu. Um bilhete com apenas uma frase e uma nota. A frase nunca mudou - querida, nunca me esqueci de ti. A nota, primeiro de escudos e depois de euros combinava mal com o romance que D. Matilde tinha decidido partilhar. Não se envia uma nota de baixo valor com uma frase para uma amada distante. O registo da carta chegou a aproximar-se do valor da nota, coisa que D. Matilde não podia dizer ao senhor Jacinto. Um dia atreveu-se: senhor, um registo por semana é muito caro, porque não envia o senhor assim mesmo, com certeza chegará ao seu destino. E ele que não, que não podia ser, que a carta era valiosa.

No primeiro ano ela enviou regularmente a carta com o dinheiro. Entre o segundo e o décimo ano levou-as para casa e guardou-as juntamente com o dinheiro numa caixinha que etiquetou como: senhor Jacinto. No décimo primeiro ano ficou com medo por causa de umas notícias de corrupção de funcionários dos correios e voltou a enviá-las e assim o fez até ao fim. De notar que era cada vez mais complexo roubar cartas com os registos electrónicos. O pequeno delito que cometeu entre o segundo e o décimo ano totalizou um valor que nunca chegou sequer a contar. Nesse dia em que o senhor Jacinto não apareceu mais, essa sexta feira de chuva intensa, ela chegou a casa mortificada com o seu roubo. Fez um pacote com as cartas que sabia serem todas iguais e com um valor em dinheiro idêntico e escreveu o nome e morada que tinha visto todos esses anos: Amélinha Dias, Rua de Baixo, nº 1 Rio Vermelho, 7655- 002 Portugal. Acrescentou um papel com a sua letra: minha querida, desculpa por todos estes anos em que guardei para mim o que era teu, também gosto muito de ti.

Depois pensou no rio e em quanto tempo o seu corpo, uma vez deitado à agua, levaria a chegar ao mar.


~CC~

segunda-feira, setembro 10, 2012

Quem acredita?


Quem é que acredita que os grandes empresários (cujos lucros em alguns casos ainda aumentaram com a crise) vão criar mais empregos por ter descido a taxa social única? É isto a dinamização da economia? Mas de qual economia? As empresas pagam menos e os trabalhadores mais...mas como é que alguém se convence da justiça de tais medidas?

Ouvi ainda há pouco na TSF que foi distribuído um manual de instruções pelos ministérios - melhor dizendo 4 páginas de propaganda - para que os ministros e respectivos demais possam explicar -usando as mesmas palavras - estas medidas. Fico hesistante...que eles nos consideravam estúpidos ja sabia mas parece que também consideram os outros ministros analfabetos e por isso fornecem-lhes tudo explicadinho, não vão eles baralhar-se.

Tristes, são uns tristes.

~CC~

terça-feira, setembro 04, 2012

Do (des)amor


Receita de uma mulher (ambas entre os 30 e os 40) em voz sussurada e meiga à sua amiga:

Tens que diminuir as sms, vais espaçando, chega a um ponto que sentes que já vais conseguindo passar...uma por mês...até que isso acaba.

Uma vez, em tempos de desamor, eu e minha mana mais velha inventámos uma empresa para enviar sms de substituição, uma espécie de metadona que ajudaria à desabituação do amado. Em vez de um corte brusco e doloroso, traçavámos um plano de fortalecimento da auto estima de quem precisava desamar. Inventámos mesmo algumas: sabes que és linda e vai ser muito difícil passar sem ti, mas temos que conseguir (esta para os homens casados sem coragem de deixar a mulher pela amante). Para nós era uma diversão inventar estas sms ao mesmo tempo que os nossos TM estavam estranhamente calados.

De facto o amor invade tudo desde que somos crianças, todos nos querem ensinar a amar e nos dizem o que é o amor, mas ninguém nos fala de como fazer para deixar de amar.

Os dois métodos mais conhecidos têm um uma conotação masculina e outro feminina, passando ambos por infalíveís. O método masculino: arranjar outra. O método feminino: coligir dados para odiar quem se amou. Um e outro são na realidade péssimos.

~CC~