Poderia ser André aquela criança que morava na casa ao meu lado. Não obstante o seu ar grave e sério, fomos amigos anos a fio, espreitando a presença um do outro pelo muro que separava os nossos quintais. Era uma criança que raramente se ria e não manifestava por mim nenhum afecto, não obstante ser o primeiro rapaz com quem brinquei aos médicos. Não sei se ele foi a primeira das desilusões amorosas mas foi certamentente o mistério primeiro da infelicidade. E eu achava que uma das missões que me estava secretamente confiada era a de o fazer rir.
Às vezes este André que não é André regressa até mim das formas mais estranhas. Esteve presente esta semana numa reunião de professores do Ensino Básico em que estive, era o nome mais pronunciado por todos eles. Com apenas 13 anos já estava marcado para o insucesso, nada nele parecia aproveitar-se, se desaparecesse seria para todos um alívio. Não era só infeliz, causava infelicidade. E um nome pode repetir-se assim até à exaustão por todos sem que ninguém se levante para dele se dizer uma coisa boa ou acenar qualquer esperança. Penso que se ele desaparecesse com a sua família para lado nenhum, nenhum daqueles adultos perguntaria por ele. Resta-me pensar que tem uma vizinha que o espreita, achando que nos seus olhos escuros reside um segredo maior, que pensa que o pode fazer feliz.
~CC~
2 comentários:
E se não existir vizinha, ficará para sempre marcado pelos adultos.
Percebo que não somos santos, mas temos também uma grande incapacidade para conviver com o difícil-
Marta, havia uma alínea nos questionários que era habitual/ o "concordo totalmente", escolho essa como repsosta ao que dizes.
Abraço
~CC~
Enviar um comentário