sexta-feira, setembro 19, 2008

Homens e bichos (VIII)

Perguntas-me porque escolhi o castelo de Almourol?! Primeiro tenho que dizer-te que desde que acabei Arqueologia há cinco anos atrás que ando de estágio em estágio profissional e por este andar acabarei a carreira como estagiário profissional. Dito assim, compreendes que havia este lugar e que cá vim parar.

De resto escavo desde criança, ando sempre à procura de alguma coisa e qualquer resto de loiça com mais de 2000 anos já me faz feliz. Dou-me bem com o que resta dos homens, melhor com as suas memórias do que com a sua presença. Digo-te mais, Almourol é capaz de ser um dos únicos castelos virgens que nos resta. Está livre de cafés, de lojinhas de imitações de objectos antigos, das pousadas de portugal e animações de todo o genéro. Aqui minha querida, não se dança nem se canta, não se come nem se dorme, aqui só há a pedra e o rio. De vez em quando chegam umas quantas pessoas, mas poucas e só mesmo no Verão. O barqueiro tira-lhes uma fotografia com o castelo por trás e já ficam felizes, de resto nunca demoram mais de meia hora, isto é uma ilhota perdida no meio do Tejo, onde só os mais loucos se poderiam lembrar de fazer um castelo.

Eu estou bem aqui, não tenho saudades de quase nada, às vezes lembro-me da Maria, mas já estamos juntos há tantos anos que mesmo sem estar com ela, é como se estivesse. Para mim, isto seria o Paraíso, não fora a pomba branca. Já estive em algumas escavações, mesmo antes de acabar o curso e obviamente que as pedras velhas estão cheias de histórias e lendas, sei isso muito bem. Mas nunca, nunca alguma vez, nem nos meus piores pesadelos, me imaginei a falar com uma moura disfarçada de pomba branca. Se me contassem, eu também não acreditaria, por isso compreendo-vos, mas ela existe, posso assegurar-vos.
~CC~


5 comentários:

Mónica (em Campanhã) disse...

passei assim em Almourol, numa rota de castelos que iniciei com o meu amor há muitos anos e que nunca chegamos a concluir. meia hora sem sequer a foto pois o barqueiro não estava lá. ah,. e era Inverno, um Janeiro chuvoso que nos enxotava das ruas e dos castelos para dentro dos quartos dos hotéis.

Mar Arável disse...

A pedra e o rio

que bela sinfonia

de sussurros

JOSÉ RIBEIRO MARTO disse...

Ainda não compreendi , mas admito que já tenha sido contada aqui a lenda da pomba branca de Almourol, o que é intrigante quando não se quer pensar sequer que a tal pomba apareça em pesadelo, assegurando-se , no entanto, a sua existência....
Assim sendo , admitoque a pomba branca seja de outra cor e ande pelo trilho de um estagiário sempre nómada... Serà ?
Cordialmente
_____________ JRMarto

CCF disse...

Mónica, Almourol é mesmo assim, tão belo, quanto tristonho!

Mar, pedra e rio é uma combinação eterna de diálogo.

JRM, para ti a lenda em versão simplificada: uma moura, filha de um grande califa, estava apaixonada por um rapaz cristão de uma pequenina aldeia do Tejo. O pai era contra aquele amor e fechou-a numa torre do castelo de almourol, enquanto mandava matar o rapaz. Ela transformou-se em pombra branca e rondou para sempre a campa do rapaz.

Séculos mais tarde, ela aparece ao nosso estagiário de Arqueologia, homem até aí só crente na razão humana e nada dado a magias, e ainda menos a paixões.
Abraço,
~CC~

JOSÉ RIBEIRO MARTO disse...

Compreendida a lenda, o meu obrigada , tem todos os elementos para ser uma bonita lenda para eu contar !
abraço
____________ JRMarto