Este é o tempo da partida dos homens e mulheres que amam a poesia, mesmo que nunca a tenham escrito. Há sempre tanta gente a abraçar a morte no Outono. É do cair da folha, mesmo que ele se atrase, como este ano. É a mistura do amarelo e do laranja das folhas com a terra que deixou fugir o calor e se tornou fria e mais escura. É esse apelo da tristeza a cair sobre nós como uma sombra. É a noite a chegar tão depressa que o entardecer se esvai num minuto do olhar.
Quando essas mãos escuras anunciam Novembro e ainda por cima não há água para lavar as nossas mágoas, procuro um refúgio.
E é então que me lembro que este é também o tempo dos doces e das compotas. Peço à minha mãe que me faça doce de tomate, prometo que lhe trarei quilos deles. Penso que eu própria arriscarei uma geleia de marmelo ou mesmo marmelada. Penso no doce de goiaba que tu fizeste, do cheiro delas apanhadas do teu quintal e que enchia a minha casa no final do Verão. Penso no doce maravilhoso de figo que um amigo faz. Penso nos doces do Casal, onde moram os meus rapazes do campo e nas saudades que tenho dos seus abraços.
E há ainda a magia das castanhas, do fumo delas a encher as ruas das cidades, do modo como as esfriamos nas nossas mãos para as saborear ainda quentes por dentro das nossas bocas.
E há a terra onde se pode preparar a sementeira, logo que feitas todas as queimadas.
Afinal o Outono pode ser tempo de nascer, sobretudo se a minha mãe fizer o doce de tomate e se os rapazes, apesar da distância, mantiverem quentes os seus abraços.
~CC~
5 comentários:
Gosto disso tudo e de...romãs. Apesar de não gostar do Inverno, nem de vento, nem de chuva. Sinto-me sempre agredida no Inverno.
Só vim dizer-lhe que passei para lê-la... e conhecer mais um bocadinho desse infinito ser.
Um beijo,
Madalena.
Um dia escrevi no meu blogue que este ano, não me iria apetecer ver o cair nem o amarelar das folhas. Este texto veio lembrar-me das coisas boas que o Outono afinal também tem.
Parabéns e obrigada
Cristina, romãs são paisagem para mim, gosto muito de as ver e pouco de as comer! Mas olha, parece que as montras se enchem de vestidos este Outono...e esse é um gosto partilhado :)
Madalena, estendo para si a passadeira azul, beijos mil.
Paula, fui espreitar o seu lugar virtual. A morte é uma ideia terrível, só duas coisas me aliviam de viver com esse fantasma: pensar que transporto em mim essa vida de alguém que amei; pensar que essa morte pode, na sua fusão com a natureza, gerar vida. Outros aliviam a dor de outro(s)modos igualmente legítimos...e também ajuda pensar nas coisas boas! Um abraço
~CC~
Morreu um amigo de quem tinha tantas saudades, saudades repentinas e tão fortes.
Não consegui falar com ele.
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