quinta-feira, abril 22, 2010

Tempestade

Não devia ter escolhido o último andar por causa da nesga de rio, da proximidade do céu, dos dois castelos presos no olhar. Não devia porque agora chove e troveja quase dentro do quarto e os rasgos de luz tiram-me o sono, e não há nenhum abraço capaz de acalmar este medo irracional das tempestades, ainda mais quando elas chegam assim na Primavera. Os pais envelheceram, e estão doentes, e os filhos são ainda demasiado novos, estamos entregues à idade adulta onde a palavra medo é um esconderijo. Falo assim com a tempestade, de olhos abertos, é a ela que lhe falo do medo, e assim ela vai-se embora de mansinho, com a compaixão que a natureza tem da fragilidade dos homens. Falo com a tempestade e peço-lhe que se vá embora, que procure lugares onde o sono é pesado e ninguém tem medo de quase nada, que vá para lugares onde o coração não estremece a cada trovão.

Para a próxima pensarei melhor sobre o último andar, esta proximidade do céu.
~CC~

1 comentário:

candida disse...

muito bonito o teu texto.
kixes