A nossa vida parece às vezes poder mudar num indivizível minuto, estar num lugar errado à hora errada ou no lugar certo à hora certa. O amor e a morte podem surgir assim de repente ao virar da esquina. Leio no jornal Sol de hoje que na Mealhada uma pessoa que levantava pacificamente dinheiro no multibanco da área de serviço foi colhida brutalmente por um automóvel desgovernado e teve morte imediata. Choca-me esta morte assim sem razão, sem aviso de doença ou motivo imputável. Choca-me ainda mais que as recentes mortes de governantes e chefias militares na Guiné, essas explicáveis pelo ódio.
Lembro como no filme o leitor, o rapaz se senta para vomitar na entrada de um prédio degradado e assim encontra Hanna, mulher bem mais velha, que na sua contida generosidade o ajuda a voltar a casa. Maravilha-me aquele encontro que nada fazia prever, sustido pela impossibilidade que seria o cruzamento daquelas vidas noutro horizonte qualquer. O amor, pode surgir assim também, sem qualquer sinal. E maravilha-me essa possibilidade, mais ainda do que quando ele surge em consequência de um conhecimento ou relação longa entre duas pessoas.
E lembro-me da forma como também escapei milagrosamente com vida num despiste na autoestrada do sul e da felicidade que senti por ir sozinha. Parece que ganhamos uma segunda vida e com ela novos sentidos.
Há cerca de um mês atrás mais um episódio. Ia conduzido devagar pela cidade e vi com clareza a mãe, a jovem e a criança no fim da passadeira. Já tinham atravessado e por isso eu não necessitava de parar. Mas a criança levava uma bola e a bola soltou-se das suas mãos, pelo que a criança voltou atrás de repente e vi a bola a correr pela trajectória inversa à que eles tinha feito. O meu carro já estava em cima da passadeira quando a criança volta atrás e foi apenas por um reflexo rapidissímo de curvar o carro para a faixa mais à direita que não lhe bati, mas parei claramente já em cima da passadeira. O miúdo devia ter uns 4 anos, saiu fora do ângulo de visão do vidro da frente e nem sequer vi logo se tinha conseguido desviar ou se o carro o tinha atingido. Sai em pânico e deve ter sido por apenas meio metro que não ficou debaixo do carro. A mãe, muito assustada, deu-lhe imediatamente duas palmadas. Mas o que teria acontecido se lhe tivesse batido, a mãe culparia na mesma a criança? A verdade é que eu parei em cima da passadeira, para quem não tivesse visto, seria para todos os efeitos um atropelamento na passadeira, dificilmente poderia provar que a criança já tinha atravessado e tinha voltado para trás em busca da bola. As nossas vidas ficariam tragicamente marcadas por uma bola que se tinha soltado das mãos. Ainda hoje respiro de alívio.
Há cerca de um mês atrás mais um episódio. Ia conduzido devagar pela cidade e vi com clareza a mãe, a jovem e a criança no fim da passadeira. Já tinham atravessado e por isso eu não necessitava de parar. Mas a criança levava uma bola e a bola soltou-se das suas mãos, pelo que a criança voltou atrás de repente e vi a bola a correr pela trajectória inversa à que eles tinha feito. O meu carro já estava em cima da passadeira quando a criança volta atrás e foi apenas por um reflexo rapidissímo de curvar o carro para a faixa mais à direita que não lhe bati, mas parei claramente já em cima da passadeira. O miúdo devia ter uns 4 anos, saiu fora do ângulo de visão do vidro da frente e nem sequer vi logo se tinha conseguido desviar ou se o carro o tinha atingido. Sai em pânico e deve ter sido por apenas meio metro que não ficou debaixo do carro. A mãe, muito assustada, deu-lhe imediatamente duas palmadas. Mas o que teria acontecido se lhe tivesse batido, a mãe culparia na mesma a criança? A verdade é que eu parei em cima da passadeira, para quem não tivesse visto, seria para todos os efeitos um atropelamento na passadeira, dificilmente poderia provar que a criança já tinha atravessado e tinha voltado para trás em busca da bola. As nossas vidas ficariam tragicamente marcadas por uma bola que se tinha soltado das mãos. Ainda hoje respiro de alívio.
É assustador e trágico que a vida não possa ser inteiramente dominada pela nossa razão e pelos nossos actos, que a todo o momento nos aconteçam coisas como estas que mencionei, coisas que o povo atribui ao azar e que não sabemos classificar inteiramente de outro modo. Mas ao mesmo tempo quando os acasos são felizes ou quando escapamos milagrosamente aos infelizes, tudo nos parece mais belo. Para quem acredita em Deus, é fácil encontrar explicação, atribuindo-lhe a responsabilidade. Mas para quem, como eu, não tem nenhuma certeza quanto à sua existência, tudo isto nos surpreeende e interroga.
~CC~
5 comentários:
Acredito que cada um de nós tem uma missão neste mundo.
E que caminhamos sós pela estrada da vida, procurando a perfeição...
Carmo
Na verdade
viver é um desfio permanente
uma surpresa por um fio
Costumo pensar que as coisas funcionam como peças de dominó alinhadas e que a mais pequena força, intencional ou desastrada, que lhe imprimimos vai desencadear uma reacção que escapa à nossa vontade.
Quando concorri para a universidade levava na cabeça a ideia firme de concorrer em primeiro lugar para Lisboa. Quando peguei na esferográfica, no último segundo, optei pelo Porto. Sei que tudo teria sido diferente se a minha opção tivesse sido a primeira e que, provavelmente, não conheceria muitas pessoas que hoje dão sentido à minha vida.
Não sei se Deus existe, só sei que fico feliz - e intrigada - quando algo de bom que desejei acontece quase no momento e da forma que o imaginei, sobretudo se as probabilidades de tal acontecer são poucas.
Feliz Dia da Mulher!
os deuses são excelentes bengalas para essa caminhada de que fala. há quem não precise, há quem não queira, há quem não goste de bengalas.
para mim, a vida é um somatório de acasos, de opções aleatórias, cujas consequ^ncias não adivinhamos.
e os deuses não têm nada com isso. são meros espectadores.
o comentário pode parecer despropositado face a profundidade do post, mas... o que mais temo na estrada são bolas. exactamente.
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