segunda-feira, janeiro 19, 2009

Partida-chegada-largada

Eu fiz ainda agora uma mala e parti num vapor até ao outro lado do Equador, o que era importante era cruzá-lo como quem risca para si uma outra vida. Eu trouxe na mala só duas mudas de roupa e dois ou três objectos: o papel, a caneta, um livro de poemas. O mais importante deixei lá: esta infinita tristeza tecida no desespero da maldade das pessoas próximas. A maldade distante não nos dói assim, apenas a que se enreda junto à nossa pele. Agora tenho por cima de mim esta noite tão quente, tenho só o céu azul sorrindo estrelas.

Não fora o teu rosto de menina cheio dos teus olhos de mel, não fora esse teu abraço que se me entra corpo adentro, e essas vozes que estão no meu sangue a ligar-me a vós, e já tinha ido. São todos esses nós que aumentam o medo e me atam os pés com as suas luzes sombrias, eu poderia partir já hoje sem pena nenhuma do país que deixo para trás. É um país de lamúrias onde os fracos se protegem e os fortes de atacam, é uma aldeia onde os estranhos se abatem e os próprios se defendem, é um país que apenas em algumas madrugadas deixou de ser cinzento, não obstante ser bafejado pelo sol.

Resta-me apenas alguma indignação, não quero que de todo se vá. É esse resto que aguenta todas estas manhãs de nevoeiro, é esse resto que ainda caminha, que ainda procura, que ainda chora, que ainda acredita.
~CC~

3 comentários:

Carla disse...

fiquei com um nó na garganta e os olhos marejados de água...e perguntei-me até quando se impedirá as pessoas de sonhar?
beijos

Gregório Salvaterra disse...

Abraço.
*jj*

CCF disse...

Escrever é uma das formas mais eficazes de aliviar a dor. Desculpem se alguma coisa dela passa para vós, às vezes simplesmente esqueço que está aí alguém que pode ler. Obrigado pelo carinho...isto vai :)
~CC~