terça-feira, janeiro 20, 2009

O meu nome é Vanessa (VII)

Perguntei-lhe pelo tio, se tinha feito queixa dele, se tinha dito alguma coisa à família. E imaginei-a como uma miúda, uma adolescente ruiva com olhos ainda transparentes e muitas sardas. E ela disse que não tinha dito nada a ninguém, com medo de acharem que mentia. Disse, como todas as vítimas, que de certa forma se sentia culpada, como se alguma coisa nela atraísse a maldade, o desejo dele. Retorqui que o caso dela era igual ao de tantas outras meninas abusadas por alguém da família, ao que ela respondeu que era diferente, que ela era diferente.

Chegou a acontecer a segunda vez, um dia que ele bateu-me à porta por saber que mais ninguém estava em casa e atirou-me para o sofá, mas não aconteceu a terceira. Arranjei um canivete enorme e passei a andar sempre com ele. E no dia de Natal, lembro-me como se fosse hoje, ele veio encostar-se a mim na cozinha e eu saquei do canivete e disse que se ele me voltasse a tocar, ia usá-lo. Disse-lhe: na próxima vez matas-me primeiro antes de conseguires o que queres ou então sou eu que o faço contigo. Não sei onde fui buscar aquela coragem. Acho que aquilo teve um efeito de choque nele, de repente eu era uma leoa, era já uma mulher e não a miúda de que ele abusava. E como cobarde que era, só procurava as miúdas. Além de me defender a mim, passei a proteger todas as miúdas da família, afastando-as dele o mais que podia.

E enquanto a ouvia, olhei os olhos dela e pareciam transparentes como já deviam ter sido outrora, eram afinal gotas de água que estavam ali fixas sem sair, eram lágrimas verdadeiras mas que estavam secas, congeladas.
~CC~

1 comentário:

Anónimo disse...

O mundo está cheio de Mulheres fortes...

Felizmente, algumas, também escrevem muito bem!

Bjs
João