quinta-feira, julho 24, 2008

Notas da viagem a Itália (I)

Há pessoas que viajam com uma pequena mochila e desconhecem por isso as longas esperas nos tapetes de bagagem, há quem não corra atrás da "first bag", sempre admirei estes quase passáros, muito embora pareçam demasiado desligados da carga simbólica que os objectos têm. Ora dentro das nossas roupas estão os nossos cheiros e os nossos livros transportam as marcas dos nossos dedos, e disso não posso desligar-me.

Outras pessoas impressionam pelas malas pesadas e enormes que levam para três ou quatro dias como se a sua estabilidade dependesse do número de coisas que conseguem trazer de casa. Nunca irão nem vestir nem usar metade dos objectos que transportam e o peso excessivo atrapalha-os nas escadas rolantes e nos longos corredores dos aeroportos. Acreditam demasiado nos objectos e dependem deles.

Procurei levar para quatro dias uma mala pequena e flexível e comigo apenas uma pequena mochila com três ou quatro objectos, nos quais não se incluia nem um de higiene pessoal, nem sequer uma escova de cabelo. Isso não seria problemático se minha mala tivesse chegado a Itália, mas ela ficou no aeroporto em Lisboa. Acresce que nesse mesmo dia tinha que viajar para 300 Km a norte de Roma, para Arezzo e depois Cortona e não pude esperar pelo voo seguinte. Pedi que a deixassem em Lisboa, mas responderam que o procedimento era o de a enviar no avião seguinte, a inflexibilidade da burocracia é ainda uma coisa que me espanta. A mala passou assim três dias em Roma sem mim e eu passei os mesmos sem ela.

Na primeira noite não tinha nada mesmo a não ser a roupa que trazia vestida e o hotel era tão fraco que em nada ajudou, experimentei o que é um banho só a água, um cabelo molhado completamente despenteado e uma roupa interior mal seca por ter sido lavada na noite anterior.

Ao início fiquei perdida sem nada de meu e sem ter nada para substituir. Depois deram-me meia hora para comprar o mais urgente, mais exactamente das 9h às 9h30 porque iríamos viajar para o seminário e esse era longe de tudo. Comprei quase nada, as minhas coisas durante todo esse tempo cabiam na minha pequena mochila. E depois da falta do primeiro dia, deixei de pensar nelas e percebi que era mais livre do que eu própria pensava e que precisava de muito pouco. É claro que quando as minhas colegas mudavam a segunda vez de roupa no dia, descendo vaporosas para o jantar, sentia uma certa inquietação, acompanhada do sentimento de ser a mais feia e mal vestida da sala, mas depois de cinco minutos de conversa e das primeiras garfadas de pasta e de chianti, só me dava uma imensa vontade de rir.

Depois fui buscar a mala no dia da partida para Lisboa, mas como estava retida nas chegadas, saí com ela como se naquele momento tivesse chegado a Roma. Cheguei duas vezes a Roma numa só ida. Mas Roma lida ao contrário é outra coisa, uma coisa boa a que se pode chegar mais do que uma vez, e então pensei que era esse o sentido e voltei feliz.
~CC~

5 comentários:

Gregório Salvaterra disse...

Roma uem et oma.
Muitos dos objectos que usamos têm mais carga simbólica do que verdadeira utilidade. Mas também temos necessidade disso e é essa a sua utilidade.
~CC~ ao contrário será outra coisa.
Beijo
*jj* (ao contrário também)

clorinda disse...

A aventura fez parte da viagem...
Desejo-lhe muitas boas viagens e melhores aventuras.
Abraço, clo

Carla disse...

muito bom o teu texto...e com um final delicioso
beijos e bom fim de semana

CNS disse...

Teimamos em pensar que os objectos nos vestem. Em vez de tentarmos vestir os objectos que realmente nos pertecem.

Gostei muito deste bocadinho de azul.

João Torres disse...

Grandes aventuras...

Um beijo de Tarragona, mas com malas.

Joao