terça-feira, abril 22, 2008

Diário da amante feia (II)

- O teu cabelo é cor de fogo.

Folheava um livro ao lado dele e ouvi-o dizer esta frase. Olhei-o como se todo o espanto do mundo morasse dentro de mim. Mas ele nem se voltou, os olhos poisados nas folhas dos livros, passando-as lentamente uma a uma.

- O senhor disse alguma coisa? Falou comigo?
- Não, não disse nada.

Não disse nada. Ele disse que nada tinha dito. Mas eu ouvi, ouvi claramente a alusão ao cabelo que tanta dor me tinha causado desde que reparei como ele era tão diferente do das outras meninas. A frase era uma exclamação de tom grave e admiração profunda que me tinha entrado pela alma até aos ossos. Teria eu atravessado 32 anos sem ouvir vozes para elas aparecerem agora dentro de mim?! Ou teria adquirido subitamente a capacidade de ler pensamentos alheios?! Experimentei colocar-me ao lado de outro homem, calada, a ver as capas dos livros. E de outro e mais outro. Mas não havia efeito nenhum, nem um olhar directo ou indirecto para mim, só silêncio, indiferença.

Corri pela livraria à procura do homem da frase mistério, mas nem a sua sombra pairava já nas paredes.

A frase dentro de mim estes dez anos: - O teu cabelo é cor de fogo.
~CC~

4 comentários:

Anónimo disse...

não sei mas acho que a frase:
"O teu cabelo é cor de fogo"
LInda, tipo bueda gira.....

Anónimo disse...

aquele comentário era meu.

~AF~

Carla disse...

poesia nas tuas palavras...com sentimentos cor de fogo
beijos

Gregório Salvaterra disse...

...e arde-me por dentro sem se ver...
E hoje fico assim.
Beijo
*jj*