Entre os doze e os quinze falei com fantasmas, tratando-os por tu. Se me deitasse no escuro conseguia ouvir vozes que não sabia de onde vinham. Se me concentrasse muito em alguém conseguia saber o que estava a pensar. Vivia nesse limbo entre a sanidade e a pura loucura, ou seja, crente nos meus dons especiais. Precisava trabalhá-los, era o que me diziam.
Um dia esse mundo febril em que a minha pele era apenas o ecoar dos deuses e o meu coração a busca infinita da razão de estarmos aqui foi atravessado por doses extra de Marx, Reich, Bakunin, testando com o fogo da paixão uma religiosidade tecida com fios sobrenaturais e bebida da nobre herança paterna. O que não fazemos por um amor aos dezasseis anos. Foram-se os diálogos com os fantasmas e um futuro brilhante como sensitiva, tudo apagado pelas carícias terrenas nos jardins públicos da cidade.
Ainda assim sobrou-me o suficiente da loucura adolescente para deixar-me tocar por Hereafter, para perceber que o amor na sua força máxima só pode rejeitar a morte. E, contudo, os mortos pedem o seu descanso, nós é que não podemos, não conseguimos.
~CC~