A minha vida tornou-se numa dança depois daquele dia na livraria em que ouvi a voz dele como se ela estivesse dentro de mim.
Todos os dias depois daquele voltei lá. Almoçava a correr e na meia hora sobrante ia dançar no meio dos livros como se fosse um bicho a rodear a presa, fazia círculos em torno dele, primeiro círculos largos e cada vez mais próximos para que o meu cabelo cor de fogo entrasse na rota dos olhos dele. Esperava pelo incêndio das almas.
Estamos juntos há dez anos, sem incêndio das almas. Sonho ainda por vezes com a livraria, as folhas dos livros soltam-se e voam no vento onde eu danço* , danço no meio do papel e mal me distingo dele porque sou branca e triste como um cisne.
~CC~
* "O espírito da dança não tem cor, forma ou tamanho, mas envolve o poder de unir, e também a força e a beleza que se encontra em nós. Cada alma que dança, jovem, velha ou de uma pessoa incapacitada, cria e transforma ideias em movimentos artísticos que podem mudar as nossas vidas", escreve a coreógrafa e bailarina sul-africana Gladys Faith Agulhas, premiada pelo trabalho que tem desenvolvido ligando a dança, a educação e a integração social.