segunda-feira, abril 21, 2008

Diário da amante feia (I)


Ele abriu os olhos já o sol da manhã ia muito alto. Eu tinha ficado quieta ao seu lado, imóvel, com saudades do tempo em que fumava um cigarro na cama, mas ao mesmo tempo feliz por já não o fazer.


Quando ele abriu os olhos e me viu, eu vi-me também ao espelho e vi que ele me tinha visto nesse mesmo espelho. Lembrei-me das duas gotas grossas que me desceram pelo rosto no dia em que um miúdo me chamou feia no pátio da escola, tinha eu apenas seis anos. Se as pudesse deixava-as cair também agora, no momento em que via o modo como eu era feia aos seus olhos, mas há muito que no meu olhar não havia nada para deixar cair.

Procurei dentro de mim um modo de sorrir que sabia fazer-me mais bonita e insisti num pensamento reconfortante: há dez anos que este homem vive preso de mim, não obstante os olhares dos homens não me envolverem nunca, quase nunca.


Queria usar a palavra amor, gritar por ele usando esta palavra, mas ela não saía na minha voz. Ele perguntou: porque estás tão calada?

~CC~

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