terça-feira, abril 26, 2011

ALMAR IV

A tristeza começou nesse dia em que os homens Almar deixaram de ser Guarda-Rios e começaram a morrer de uma doença sem nome.

Ficámos sem terra embora a nossa terra fosse um lugar junto da água. Mas sobraram os panos, os panos das mulheres Almar. E, com eles, elas inventaram outra vez a vida. Levaram-nos para as feiras como sempre tinham feito, mas agora com mais flores, mais peixes, mais luas... eram cortinados, tapetes, colchas e vendiam-se como únicos que eram, cada um diferente do outro.

E nós, crianças Almar, começámos a usar os tecidos para bonecos grandes de espantar a passarada. Éramos nós que fazíamos nascer os espantalhos. Os donos das quintas chamavam-nos porque, por uns tostões, uma fruta, um caldo, um naco de pão com azeitonas, nós pintávamos a paisagem de cor e de poesia.

Cresci criança Almar, pobre como pensava que só nós éramos, mas rendida à mudança da cor da terra em cada estação. E ainda sonho com espantalhos que abrem os braços e dançam para espantar a passarada.


~CC~

1 comentário:

Margarida Belchior disse...

Um dia hei-de fazer parte de um povo assim.

Bjs grds