Há filmes belos e intensos como Expiação*, uma Primavera de águas claras seguida de um duro e lodoso Inverno. É um filme de almas presas entre o céu e o inferno.
Há filmes recheados de tonalidades e sabedoria como Michou d'Auber (Michou em sarilhos)* , um amarelo vermelho em tudo Outono. É um filme de imensa esperança na bondade humana.
E há objectos coisa nenhuma como Floripes, cuja identidade é uma viagem entre o documentário e a ficção, habitado por fantasmas de pele e rugas de sal. Ninguém é actor porque todos se representam a si próprios ou representam alguém que realmente podiam ser. Na ilha da Culatra e em Olhão, vila da Restauração, vivem os velhos compostos e os velhos decompostos, entre paredes brancas pintalgadas de sangue mouro. Os olhos das pessoas de vida real, directos nos nossos, encontram um eco de séculos do medo das coisas que não sabemos. São muitas memórias de mouras encantadas desterradas em terras que não são suas, presas de um quebranto tão escuro como a noite, tão escuro como o mar. Um objecto singular, este filme.
E a língua que falam é não é português, é um arrastar avinagrado de limos da ria formosa, é por isso e estranhamente um falar legendado. De repente estou na casa dos meus avós, entre cravos e redes de pesca, entre santinhos escondidos debaixo da cama e a volta a Portugal em bicicleta. O meu avô também esteve com a moura encantada, diz ele que nos Pinheiros de Marim. Pessoas singulares.
Muitas vezes me comovi dentro de um filme ou dentro de um livro, levada ao colo até lugares de água, mas nunca tanto como com os olhos a espreitar reais os meus e o roçar das peles junto da minha pele.
E é também esta a comoção que me tem acontecido por estes dias cheios de crianças e jovens em que ninguém aposta, dentro de escolas e bairros miseráveis e que de repente vejo rir por se ter criado um espaço em que brincar é digno. É na maior parte das vezes apenas um momento, como quando o sol espreita num dia de chuva. Mas alimentam-me os momentos, os filmes singulares.
E é também esta a comoção que me tem acontecido por estes dias cheios de crianças e jovens em que ninguém aposta, dentro de escolas e bairros miseráveis e que de repente vejo rir por se ter criado um espaço em que brincar é digno. É na maior parte das vezes apenas um momento, como quando o sol espreita num dia de chuva. Mas alimentam-me os momentos, os filmes singulares.
~CC~
* recomendados pela Cristina GS na Poeira dos dias e por JVT no Ninguém lê.
2 comentários:
Olá CC
passei para te ler e para te dizer que te deixei um miminho nos meus "desalinhos"
Bom fim de semana
gostei do que li,
mais uma vez parabéns pela sua sensibilidade.
Clo
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