sábado, janeiro 26, 2008

No tempo das princesas sós (VII)

Estavam sentadas em frente à janela que deixava ver o céu branco e azul, anunciando o início do último Verão. Bebiam chá de menta quase frio e sabiam que este era o momento da despedida mas nenhuma delas imaginava que as suas vidas se iriam desabitar assim das outras. Pelo contrário, trocavam as moradas possíveis, as que pertenciam ao seu passado porque os endereços do futuro eram ainda ambíguos e incertos.


Tilía: É meu primo e tenho simpatia por ele, escreve-me cartas já há algum tempo, mas nunca lhe dei grande importância.
Perpétua: Tenho pena de ti, o mais certo é que um casamento se desenhe no teu horizonte.
Lucilima: Não queria esse destino para mim, mas não vejo nada de errado nele.
Perpétua: Ela queria ser mestra e não mulher casada.
Tília: Não sei, acho que estive aqui como em qualquer outro lugar, estive só a ver.
Rosa: Se casares, não poderás ficar apenas a ver como é.
Tília: Deixemos o meu destino, sabemos que ele será sempre traçado pela minha vontade de ficar a ver. Rosa, que farás do teu?
Rosa: Quero formar um coro de meninas, vou tentar fazê-lo na igreja da minha aldeia.
Perpétua: Uma aldeia Rosa, para ti deveria ser uma cidade europeia e só devias cantar à noite, porque a tua voz é da filha do incêndio.
Lucilima: Eu acho que devias cantar no teatro. O meu destino é o único claramente marcado e o único inteiramente traçado pela felicidade.
Tília: Sempre vais trabalhar com as crianças refugiadas? Em tendas no meio da lama? Em lugares o mais próximo possível das trincheiras? Que lhes podes ensinar em momentos tão violentos...só quererão salvar as suas vidas e comer todos os dias.
Lucilima: Quero ir e sei que vou, é tudo e é muito.
Rosa: E tu Perpétua, porque não nos dizes nada?
Perpétua: Mas eu só sei que vou ver o mar.


Passaram mais de vinte anos sobre esta conversa e nada sei sobre o destino de cada uma delas. Minto: sei apenas que nunca mais se viram e que nenhuma delas escreveu uma única palavras às outras. Talvez se procurem agora, talvez mesmo hoje ou amanhã.


Perguntam quem sou eu, eu que sei tanto sobre o tempo mais azul da solidão das princesas.
Não quero mistérios nesta história, eu digo-vos quem sou.

Eu sou apenas isso: o próprio ar que encheu os dias e se pendurou nas noites.
(fim)
~CC~

2 comentários:

João Torres disse...

A foto é linda!

Bjs
João

Anónimo disse...

o meu destino, também ficará traçado ou de foi traçando de ficar a ver.... ainda o tempo, mas agora de outra forma traçado....
corrdialmente
JRM