segunda-feira, abril 27, 2009

Ainda Abril (II)

É simples o meu 25 de Abril, é todo silêncio. Um silêncio estranho e pesado que surgia nos adultos sempre que as crianças entravam na sala. Um calor pesado. Uma leve supeita de que alguma coisa se passava.

Um mês depois os tiros contínuos desde o pôr do sol até ao amanhecer, o medo que não nos deixava dormir. Depois as pontes aéreas Luanda-Lisboa. As malas feitas à pressa, tudo deixado para trás. A minha almofada empurrada para dentro da mala gigante, a maior que já vi. As lágrimas da minha irmã adolescente a escorrer pelo seu rosto calado. O silêncio, um pesado silêncio.

A minha pergunta insistente que demorou dois anos: quando voltamos para casa?

Passei a chamar-me retornada. Retornado era uma coisa que não se queria nem num lado nem no outro, era ser sem terra. De um lado e do outro da fronteira um ódio pequenino, dito de boca fechada.

Dois anos depois num comício do Otelo percebi que o 25 de Abril era afinal uma coisa boa que tinha a ver com flores e alegria. Quís intensamente ser como eles que cantavam felizes, festejei tardiamente é verdade, mas com a intensidade de um belo poema descoberto no raiar da adolescência. E consegui amar a data que dividiu a minha infância ao meio em tristeza e alegria.
~CC~

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